08/05/2013

Duas Histórias sobre Mães


Nem todas as mães nascem com o dom da abnegação, e nem por isso são pessoas más, apenas não alcançaram a dimensão da entrega necessária para criar outro ser humano.

Essa semana, duas leitoras me mandaram depoimentos pessoais que dividirei com vocês, mas com nomes fictícios. Um foi assinado por Anita, que me contou que, numa loja, foi atendida por uma balconista jovem e humilde que comentou ter quatro filhos, e que pretendia partir para o quinto. Anita, mesmo correndo o risco de ser indiscreta, perguntou se o salário dela comportava o sustento de cinco crianças, no que a balconista respondeu: Ora, elas têm pai.

Anita não se conteve e declarou: Acho que uma mulher pode ter tantos filhos quantos ela conseguir sustentar sozinha. Diz Anita que a balconista ficou perplexa, e talvez muitas outras mães também fiquem, mas foi corajosa e realista a sua observação. Marido não é seguro-desemprego, não vale por uma previdência privada. No caso de uma separação, claro que ele terá obrigação de dividir as despesas relacionadas aos filhos, mas, infelizmente, sabemos que nem sempre a coisa se dá com essa civilidade. Alguns pais não podem ou não querem arcar com seus deveres e transferem a responsabilidade para quem manteve a guarda. Enquanto a briga é decidida na justiça, as crianças ficam desassistidas. A questão é que podemos ter quantos filhos desejarmos, desde que não transformemos o sonho romântico de ser mãe numa dívida impagável com nossos filhos e com a sociedade.

O segundo depoimento veio de uma senhora chamada Vânia que me contou que passou a vida escutando sobre como as mães são amorosas e perfeitas, mas a dela não foi nada disso. Era uma mãe desatenta, egoísta e sem o menor talento para o ofício. Vânia deve ter motivo para tanta mágoa, já que hoje sua mãe está com 95 anos, tem câncer no cérebro, e nem assim Vânia consegue perdoá-la. E se culpa, porque reconhece que já deveria ter virado essa página.

Se sua mãe não lhe causou nenhum dano concreto, se apenas não foi a mãe sacralizada que você dava como certo que teria, tente mesmo perdoá-la, Vânia. É provável que você mesma já seja mãe e saiba que há sobre todas nós uma cobrança descabida. Se o erro dela foi ter pensado mais em sua própria carreira, em seus próprios amores, em sua própria felicidade, ainda assim, antes de ser condenada, merece ser compreendida, porque é preciso reconhecer que nem todas nascem com o dom da abnegação, e nem por isso são pessoas más, apenas não alcançaram a dimensão da entrega necessária para uma tarefa desse porte: criar outro ser humano.

Entre os cinco filhos da balconista que atendeu Anita pode haver algum que irá julgar a mãe uma inconsequente, caso ela não consiga bancar as necessidades básicas de todos os irmãos, e os filhos de Vânia talvez um dia a cobrem por ter passado a vida amargurada com a avó deles. Por trás das cortinas desse espetáculo chamado maternidade, há muito desajuste e muito rancor por conta de uma idealização excessiva. Mãe não tem superpoderes. Se tiver juízo, já está bom demais.

15/5/2010 ZERO HORA.com

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